Texto de São
Luís de Montfort :
Primeiro texto: “Os que empreendem esta santa escravidão devem ter especial devoção ao grande mistério da Encarnação da Verbo. De fato, a Encarnação é o mistério próprio desta prática, porque é uma devoção inspirada pelo Espírito Santo:
* Primeiro, honrar e imitar a inefável dependência que Deus, o Filho, tinha prazer em ter de Maria, para a glória de seu Pai e nossa salvação. Esta dependência aparece de maneira particular neste mistério, no qual Nosso Senhor Jesus Cristo é um cativo e um escravo no seio da Santíssima Virgem, e depende dela para todas as coisas.
* Em segundo lugar, agradecer a Deus pelas graças incomparáveis que Ele deu a Maria e, particularmente, por tê-la escolhido para ser Sua Mãe mais digna, a escolha que foi feita neste mistério.” (Verdadeira Devoção a Maria, Publicações Montfort, 1975, p. 165).
Segundo texto: “O tempo não me permite explicar aqui as grandezas do mistério de Jesus que vive em Maria, ou seja, a Encarnação da Verbo. Eu vou me contentar em dizer estas poucas palavras. Temos aqui o primeiro mistério de Jesus Cristo - o mais oculto, o mais exaltado e o menos conhecido.
É nesse mistério que Jesus, em sintonia com Maria, escolheu todos os eleitos. Por esta razão, seu útero é chamado pelos santos de aula sacramentorum, a sala dos segredos de Deus. Deste mistério, Ele realizou todos os mistérios subsequentes de Sua vida. Por isso, esse mistério é a soma de todos os mistérios e contém a vontade e a graça de todos. Finalmente, este mistério é o trono da misericórdia, a liberalidade e a glória de Deus.”
(Ibid., p. 167)
Comentários do Prof. Plinio:
Estes dois textos são relacionados. Primeiro, São Luís Grignion de Montfort afirma que o mistério da
Encarnação é por excelência o mistério ao qual os escravos de Nossa Senhora devem ter devoção. Segundo, ele sustenta que o mistério da vida secreta de Jesus em Maria é o misterio que contém todos os outros, que é o ponto de partida para todas as maravilhas da vida d’Ele.
Iremos analisar a primeira parte e, depois, a segunda.
O Tratado da Verdadeira Devoção a Nossa Senhora é, em minha opinião, um livro profético naquilo que afirma sobre os mistérios e a devoção a Nossa Senhora. Vê-se que as coisas profundas que São Luís de Montfort diz serão desveladas na medida em que a teologia se desenvolver no Reino de Maria. Hoje, o sentido de suas palavras não pode ser inteiramente entendido. Por exemplo, quem pode entender inteiramente sua afirmação de que Nosso Senhor era escravo de Nossa Senhora durante o tempo em que Ele viveu nela?
Depois da Anunciação e do fiat de Nossa Senhora, Nosso Senhor se fez carne em seu ventre. A partir daquele momento, Ele tinha conhecimento perfeito de tudo. Ele estava enclausurado dentro dela, vivendo em contacto exclusivo com ela, numa completa dependência dela, a mais completa dependência que uma pessoa pode ter em relação a outra.
O Verbo Encarnado, completamente lúcido desde o primeiro momento de seu ser, escolheu esta vida dentro de outra criatura. Era seu desejo viver dentro daquele templo, daquele palácio, numa relação misteriosa com Nossa Senhora.
A Anunciação, de Fra Angelico
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Deus manifestou sua onipotência na Encarnação. Ele também manifestou seu poder mantendo Nossa Senhora Virgem antes, durante e depois do parto. Tudo o que diz respeito à Encarnação é tão extraordinário que Ele poderia ter feito com que Nosso Senhor nascesse brevemente após a concepção. Mas Ele escolheu de não fazer isto.
Ele quis viver os nove meses inteiros nela. Ele quis estabelecer aquela especial dependência dela. Quis ter aquela profunda e misteriosa relação de alma com Ela. Em suma, Ele quis se fazer escravo dela – mas um tipo especial de escravo – porque o escravo normal tem sua vida própria, ele respira por si próprio, ele tem liberdade de ir e vir. O que Ele quis fazer era mais do que isso; Ele quis depender inteiramente de Nossa Senhora.
Que tipo de relacionamento de almas foi estabelecido durante aquele período? Que tipo de união se deu? Esta é uma matéria impenetrável. Mas, apenas para ter um ponto de referência, podemos considerar que no mistério da Encarnação, Nosso Senhor assumiu a natureza humana – isto é, além de ser Deus, Ele se tornou verdadeiro homem. Ele adquiriu alma e corpo como nós. Como nós Ele era um descendente de Adão e Eva.
Mas, paralelamente, Sua alma humana tinha – e tem – uma tão íntima união com Deus que Jesus Cristo é parte da Santíssima Trindade. Em Jesus Cristo não há duas pessoas; há apenas uma Pessoa, mesmo que alma humana de Cristo tenha sido criada. Como pode uma alma humana constituir uma pessoa com Deus? É um mistério. A teologia nos ensina que essa é uma união hipostática, mas isso não explica o mistério.
Considerando suas naturezas humana e divina, como se pode explicar que Nosso Senhor tenha gritado do alto da Cruz: “Meu Deus, Meu Deus, por que Me abandonastes?” Naquele momento Ele continuava a ser Deus, mas Ele escolheu de sofrer em sua humanidade um tipo de desamparo e isolamento que O fez sentir um completo abandono na sua natureza humana, embora Ele continuasse unido a Deus em Sua divindade. Uma vez mais, temos um mistério.
A união de Nosso Senhor com Nossa Senhora quando Ele estava no claustro dela é menos do que sua união hipostática, mas é similar a ela. Ela é inteiramente incompreensível, mas um dia virá em que a humanidade receberá luz para a entender. Eu creio que no Reino de Maria uma explicação teológica virá para a maior glória de Deus e o bem das almas.
Ainda há muitos pontos místicos a serem explicados, todos relacionados com a união que Nossa Senhora tem com cada um de seus escravos, a qual é incomparavelmente menos do que o divino mistério de sua união com Nosso Senhor.
Todos esses mistérios estão na mesma linha, mas nós não os sabemos explicar. O que podemos ver, entretanto, é que esses mistérios vão numa direção diametralmente oposta à Revolução em duas de suas principais doutrinas: Panteísmo e Individualismo.
O Panteísmo diz que tudo é deus; uma coisa não é essencialmente distinta da outra. Todas as criaturas estão unidas umas com as outras constituindo todas uma só pessoa.
O Individualismo afirma que cada um é ele mesmo por si só e não necessita estar unido com mais ninguém.
A posição católica é oposta a estes dois erros. Ela afirma que cada pessoa é ela mesma, é um indivíduo, mas está aberta a um relacionamento com os outros que serve para aperfeiçoar a sua pessoa. A explicação profunda de como isso ocorre, contudo, é outro mistério o qual eu espero que a teologia e a filosofia explicarão no Reino de Maria.
Uma vez li um livro de revelações – não me recordo se o autor era uma pessoa piedosa ou um santo – afirmando quando as relações de Nosso Senhor com Nossa Senhora forem explicadas, será encontrada a chave para a interpretação do Apocalipse. Então, uma nova aurora teológica brilhará sobre o mundo, a qual iluminará e expandirá os prévios horizontes teológicos. Creio que devemos esperar e rezar para que esses mistérios interligados sejam um dia desvelados.
São Luís de Montfort sustenta que o mistério da Encarnação contém todos os outros. Sabemos que em cada dia de festa a Igreja nos dá graças especiais relacionadas com aquela festa. Portanto, no dia da Anunciação do Anjo e da Encarnação do Verbo esses mistérios inter-relacionados exalam um perfume especial ligado à união misteriosa entre Nosso Senhor e Nossa Senhora.
Nós deveríamos nos encomendar muito a Nossa Senhora nesse dia de festa e pedir a ela de iniciar conosco uma relação de alma de Senhora e escravo. Deveríamos pedir a ela de nos fazer seus humildes súditos, como o Menino Jesus quando Ele vivia nela.
| Prof. Plinio Corrêa de Oliveira | |
A secção Santo do Dia apresenta trechos escolhidos das vidas dos santos baseada em comentários feitos pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira. Seguindo o exemplo de São João Bosco que costumava fazer comentários semelhantes para os meninos de seu Oratório, cada noite Prof. Plinio costumava fazer um breve comentário sobre a vida dos santos em uma reunião para os jovens para encorajá-los na prática da virtude e amor à Igreja Católica. TIA do Brasil pensa que seus leitores poderiam se beneficiar desses valiosos comentários.
Os textos das fichas bibliográficas e dos comentários vêm de notas pessoais tomadas por Atila S. Guimarães de 1964 até 1995. Uma vez que a fonte é um caderno de notas, é possível que por vezes os dados bibliográficos transcritos aqui não sigam rigorosamente o texto original lido pelo Prof. Plinio. Os comentários foram também resumidos e adaptados aos leitores do website de TIA do Brasil.
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