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O Santo do Dia
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Santa Mônica - 4 de Maio

Prof. Plinio Corrêa de Oliveira
Comentários do Prof. Plinio:

Santo Agostinho tem em suas Confissões um texto especialmente magnífico no qual descreve a última conversa que teve com Santa Mônica na cidade de Ostia. É chamado de Colóquio de Ostia.

O contexto é este: a mãe de Santo Agostinho, Santa Mônica (331-387) passou quase 30 anos chorando e pedindo a Deus pela conversão de seu filho. Parecia que quanto mais ela rezava, mais fútil parecia a sua conversão.

Finalmente chegou a tal ponto que, depois de perseguir um delírio após outro, Santo Agostinho acabou comendo as bolotas dos porcos e iniciou o processo de conversão, que fez dele o grande Doutor da Igreja.

Depois de sua conversão, Santo Agostinho e Santa Mônica decidiram retornar a Cartago, no Norte da África, para ali residirem. O navio deveria partir de Ostia. Assim, eles se deslocam para o porto de Ostia, não muito distante de Roma, que naquela época tinha alguma importância. De lá eles iriam para a África.

Ficaram em uma pousada em Ostia. Certa hora, estavam juntos numa janela e começaram a conversar sobre Deus e as coisas do Céu, quando ambos entraram em êxtase.

St Augustine writing his Confessions

Santo Agostinho escrevendo suas Confissões

Santo Agostinho relatou aquele extraordinário colóquio e tornou-se um dos trechos mais famosos de suas Confissões (Livro IX).

Poucos dias depois, Santa Mônica morreria enquanto ainda estavam na cidade de Ostia. A sua missão foi cumprida na terra e Nosso Senhor a chamou ao Céu para desfrutar do galardão que merecia.

De tal modo que o último episódio da sua vida foi a alegria de ter tido aquele colóquio com o filho, que foi um prenúncio, um antegozo da visão beatífica. Se algum de nós passar por Ostia, valeria a pena ver se aquela estalagem ainda existe.

Trouxe a narração deste colóquio para ler aqui porque é uma página famosa e pode abrir nossos horizontes para os grandes portentos da hagiografia e da doutrina católica. O texto é retirado diretamente das Confissões (edição portuguesa).

Aproximava-se agora o dia em que ela partiria desta vida, que dia Tu bem sabias e nós não sabíamos...

Estas interpolações de Santo Agostinho falando diretamente a Deus são magníficas. Sugiro que os senhores leiam os Solilóquios dele que são estupendos nesse sentido. (…)

… Aconteceu, creio eu, de acordo com as disposições de Teus desígnios secretos, que nos encontrávamos sozinhos, ela e eu, encostados em uma certa janela, que dava para o jardim da casa onde então ficamos. Foi em Ostia, na foz do Tibre, onde, afastados do barulho dos homens, recuperávamos as forças após o cansaço de um longo percurso antes de embarcarmos na viagem.

Estávamos conversando ali sozinhos, docemente, esquecendo as coisas que ficaram para trás e abrindo nossos horizontes para as coisas que estão pela frente. Na presença da Verdade, que Tu és, inquiríamos entre nós o que seria a vida eterna dos santos, que os olhos não viram, nem os ouvidos ouviram, nem entraram no coração do homem.


St Augustine and St Monica disembark at Ostia

Santo Agostinho e Santa Mônica desembarcam em Ostia

Considere esta bela cena: Dois santos se perguntando como seria a vida eterna dos santos. E a alegria de Santa Mônica, ao conhecer o seu filho há muito perdido, agora ser movido por desejos ardentes de contemplar o Céu. É uma coisa maravilhosa!

Sim, os lábios de nossos corações se abriram avidamente para o fluxo celestial de tua fonte, a fonte da vida, que está em ti, para que, saciados de acordo com nossa capacidade, possamos de algum modo pensar sobre um assunto tão transcendente.

Chamo a atenção para a expressão maravilhosa os lábios de nossos corações. Quer dizer que por esses lábios o coração sorve. Esses lábios foram abertos para receber de Deus o que podemos receber nesta vida terrena em relação às alegrias do Céu.

A conversa caminhou até chegar a esse ponto, as mais altas delícias dos sentidos corporais e os maiores e mais brilhantes esplendores materiais não são dignos de comparação com a felicidade dessa vida, nem mesmo de menção. Elevando-nos em uma afeição mais ardente para essa felicidade, passamos gradualmente por todas as coisas corporais, até os próprios céus de onde o sol, a lua e as estrelas brilham sobre a terra.

É uma verdadeira busca pelo Absoluto. (1) Eles começaram considerando as coisas desta terra que encantavam os sentidos, pois estavam no decadente Império Romano em que havia fortunas fabulosas e as pessoas eram capazes de deleitar os sentidos em uma medida da qual não se tem ideia.

Então, a primeira comparação é considerar a felicidade celestial com a felicidade daqueles homens que eram considerados felizes no Império Romano. A conclusão deles: tudo isso na terra não é nada.

Então, começaram a perguntar: O que é a verdadeira felicidade? E começaram a analisar os céus, a imaginar, com base nos céus materiais e visíveis acima deles, como seria o verdadeiro paraíso celestial e qual seria a glória da visão beatífica que nele se desfruta.

É assim que ele resume a conversa. E continua:

Sim, subimos ainda mais em espírito meditando, discursando e admirando tuas obras. Transcendemos o reino de nossas almas para chegar àquela região de abundância inesgotável, onde alimentais eternamente Israel com o pasto da verdade. Aí a vida é a Sabedoria por Quem todas as coisas foram criadas – tudo o que existiu e que existirá – sem a necessidade de Ela se criar, pois Ela existe como sempre foi e como sempre será. Em vez disso, nem “foi” nem “será” existe n’Ele, pois Ele simplesmente “é” eterno.

Colloquium of Ostia

O colóquio de Ostia

Ou seja, depois de terem considerado todas as coisas materiais, passaram a considerar a alma como um elemento espiritual para descobrir algo da beleza e da perfeição de Deus. Depois de considerar a alma, chegaram à conclusão de que, no ápice de tudo, estava a Sabedoria Eterna e Incriada. Esta Sabedoria Eterna não tem passado, presente ou futuro. Foi nesta consideração sábia e suprema que seus espíritos pararam para contemplar.

E enquanto discursávamos assim, ansiando pela Sabedoria...

Ou seja, procurando conhecer Deus como Sabedoria, como fim e explicação de tudo. Os senhores veem como isso é diferente da contemplação da “heresia branca.”

...tocamos nisto momentaneamente em um vislumbre completo de nossos corações.

Eles entraram em êxtase. Enquanto conversavam sobre essas coisas guiados pela graça de Deus, em determinado momento a Sabedoria Eterna revelou-se a eles e tiveram um fenômeno místico pelo qual viram Deus.

Os senhores veem que ele apresenta isso como algo natural: eram dois santos cuja conversa era uma oração. Esta oração foi subindo em voo ordenado e quando atingiu seu ápice, então, Deus Nosso Senhor lhes apareceu para que O conhecessem como Sabedoria. Tudo aconteceu com simplicidade, numa janela de uma pousada de Ostia...

Suspiramos e deixamos ali fixados “os primeiros frutos do nosso espírito.

A melhor parte deles ficou naquela visão, não voltou para a terra.

Voltamos às expressões vãs dos nossos lábios, onde a palavra falada tem começo e fim. Como poderia ela, ó meu Deus, ser comparada com a Tua Palavra, que subsiste em si mesma, nunca envelhecendo e fazendo novas todas as coisas?

Aqui está uma insinuação de que Deus falou uma palavra a eles. Naturalmente foi a Palavra Divina. Se eles continuassem a falar depois que Deus lhes falou aquela palavra sobre Sua Sabedoria, seria como balbuciar. A visão terminou e suas palavras pareciam coisas vazias em comparação com o que Deus havia revelado sobre Si mesmo.

The Most Holy Trinity

Santo Agostinho e Santa Mônica receberam um vislumbre da Sabedoria Eterna

Santo Agostinho prossegue tentando explicar a Palavra que eles receberam:

Dissemos: suponhamos uma alma na qual a rebelião da carne, as vãs imaginações da terra, da água, do ar e do céu fossem acalmadas e silenciadas.

Sim, suponhamos que a alma se cale e se ultrapasse sem sequer pensar em si mesma; uma alma na qual todos os sonhos e revelações imaginárias, todas as palavras humanas, todos os sinais, em última análise, tudo o que existe apenas transitoriamente também são silenciados e sem palavras.

Imaginemos que nessa mesma alma exista um silêncio completo, e que se alguém ainda pudesse ouvir, todos os seres lhe diriam: “Não criamos a nós mesmos, mas Aquele que permanece eternamente nos fez.” Se, então, tendo pronunciado isso, esses seres deveriam ficar em silêncio, pois já haviam despertado seus ouvidos para Aquele que os criou.

Suponhamos então que só Ele fala, não através dessas criaturas, mas diretamente, para que possamos ouvir a Sua Palavra, não pronunciada por qualquer língua de carne, nem pela voz de um anjo, nem pelo estrondo do trovão, nem por metáforas enigmáticas, mas por Ele mesmo.


Suponhamos que ouvimos nestas criaturas Aquele que amamos, mas sem a sua mediação, como acabamos de experimentar, alcançando num só voo de pensamento a Sabedoria Eterna, que permanece imutável em cada ser.

Ele imagina uma alma que não pensa mais em nada criado, que é capaz de abstrair-se de tudo e de repente ouve uma palavra de Deus transmitindo algo sobre si mesmo.

Imagine, então, se esta contemplação continuasse e se todas as outras visões de outra ordem cessassem, se apenas esta arrebatasse a alma e a absorvesse para que a vida fosse para sempre como este olhar intuitivo – a Visão Beatífica que ansiamos – não seria esta a realização do “entre no gozo do teu Senhor”? E quando isso acontecerá? Será quando todos nós ressuscitaremos? Mas então não seremos todos transformados?

Afirma que se uma alma pudesse permanecer eternamente naquele único vislumbre já possuiria um prazer inefável e extraordinário.

Enquanto falávamos estas coisas, embora não desta maneira e com estas mesmas palavras, Tu bem sabes, ó Senhor, como o mundo e todos os seus prazeres se tornaram desprezíveis para nós naquele dia em que assim conversamos

Ruins of Ostia

Ruínas de Ostia hoje

Minha mãe ainda acrescentou: “Meu filho, de minha parte, nada mais me dá prazer nesta vida. Não sei o que ainda faço aqui, nem porque ainda estou aqui, pois as esperanças deste mundo já se desvaneceram. Havia uma coisa pela qual eu desejava permanecer um pouco nesta vida, para que eu pudesse ver você como católico antes de morrer. Meu Deus me concedeu superabundantemente esta graça, pois vejo que você já despreza a felicidade terrena para servir ao Senhor. O que então devo fazer aqui?”

Dias depois ela morreu.

Nesta visão Santa Mônica teve um presságio de sua morte; ela entendeu que não tinha mais nada para fazer aqui nesta terra...

Agora, consideremos a diferença entre a grande Santa Mônica e uma mãe sentimental. Este último diria: “Agora que meu filho se converteu, a vida começa para mim! Irei ouvir seus sermões e ver suas obras. Acompanhá-lo-ei para que tenha uma vida agradável na sua casa sacerdotal ou episcopal, admirando a sua virtude e o seu talento, que gerei para a vida natural, e serei feliz sabendo que mediante minhas orações o salvei da morte eterna para que pudesse tornar-se um grande santo. Agora, depois de todas aquelas lágrimas e orações, a vida de alegria e satisfação começará para mim!”

Santa Mônica não queria ter seu filho por motivos tão superficiais. Ela o queria para Deus. Quando sentiu que Santo Agostinho estava nas mãos de Deus, não sentiu mais necessidade de permanecer aqui para vê-lo servindo a Deus. E assim, alguns dias depois ela faleceu.

Ela foi uma grande Santa cujo último episódio de sua vida foi narrado por um grande Santo, seu filho.

Aqui vemos o que é a vida de um Santo quando não é descrita por um cronista de heresia branca.

Os senhores veem quantas coisas esta narração tem em comum com a doutrina da Busca pelo Absoluto e temas relacionados com os quais lidamos recentemente.

  1. Veja a doutrina da Busca do Absoluto em O Processo Humano, parte I, capítulo III e nesta série de artigos em nosso site.
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Prof. Plinio Corrêa de Oliveira
A seção Santo do Dia apresenta trechos escolhidos das vidas dos santos baseada em comentários feitos pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira. Seguindo o exemplo de São João Bosco que costumava fazer comentários semelhantes para os meninos de seu Oratório, cada noite Prof. Plinio costumava fazer um breve comentário sobre a vida dos santos em uma reunião para os jovens para encorajá-los na prática da virtude e amor à Igreja Católica. TIA do Brasil pensa que seus leitores poderiam se beneficiar desses valiosos comentários.

Os textos das fichas bibliográficas e dos comentários vêm de notas pessoais tomadas por Atila S. Guimarães de 1964 até 1995. Uma vez que a fonte é um caderno de notas, é possível que por vezes os dados bibliográficos transcritos aqui não sigam rigorosamente o texto original lido pelo Prof. Plinio. Os comentários foram também resumidos e adaptados aos leitores do website de TIA do Brasil.