Costumes Católicos
Práticas e Costumes da Quaresma - 5
Quinta-feira Santa Pão e Verduras
Os três maiores dias do ano Católico começam naquele dia solene em que Nosso Senhor instituiu o Santo Sacrifício da Missa: Quinta-feira Santa, primeiro dia do Tríduo.
Muitos Católicos piedosos do passado honravam esses dias sagrados não comendo nada desde a tarde da Quinta-feira Santa até a manhã do domingo de Páscoa. Aqueles que faziam esse jejum muitas vezes bebiam água benta na Quinta-feira Santa como seu único alimento. (1)
Na Idade Média, havia três Missas ditas neste dia. A primeira Missa foi a "Missa da Remissão," durante a qual os penitentes públicos foram solenemente recebidos de volta à Igreja. A segunda Missa, que ainda hoje é dita, é a “Missa do Crisma.” Durante a mesma, o Bispo benze os santos óleos a serem usados em sua Diocese no próximo ano. A terceira Missa é a “Missa da Ceia do Senhor” em comemoração da instituição da Sagrada Eucaristia e do sacerdócio.
O simbolismo da liturgia dessas Missas inspirou os povos Católicos a desenvolver seus próprios costumes e devoções particulares.
Assando Pão em Honra do Pão da Vida
O dia em que o Pão da Vida alimentou Seus Apóstolos com Seu próprio Corpo e Sangue não poderia deixar de inspirar as donas de casa Católicas a escolher este dia para assar o pão em memória de seu amado Senhor. Em muitos países, pães especiais eram consumidos no café da manhã da Quinta-feira Santa. Segundo a tradição, os pãezinhos eram sempre servidos com mel.
Que combinação adequada de pão e mel, já que a Sagrada Eucaristia foi prefigurada pelo Maná no deserto, que as Sagradas Escrituras descrevem como tendo “o seu gosto como o da farinha com mel.” (Êx 16, 31)
Cada região tinha suas receitas exclusivas para os rolinhos da Quinta-feira Santa. Em Florença, toda boa dona de casa assava Panini di Ramerino (pãezinhos de alecrim), marcando cada pão com uma cruz. Na Alemanha, os pãezinhos eram recheados com mel e chamados Judasohren (orelhas de Judas) ou Judasbrötchen, enquanto na Checoslováquia eram feitos os Jidášky pães doces em forma de cordas). (2)
Esses rolos com o nome de Judas eram um lembrete para crianças e adultos do trágico destino do infame traidor. (3)
As donas de casa também começaram a preparar seus pães de Páscoa neste dia para que pudessem receber uma bênção especial por terem sido assados no dia em que o verdadeiro fim do pão foi revelado.
As donas de casa búlgaras faziam um novo fermento na Quinta-feira Santa misturando milho, lúpulo, feijão ou grão de bico com a massa de pão. (4) As donas de casa gregas assavam seu pão doce de Páscoa (tsoureki) cheio de especiarias e moldado em formas simbólicas. (5) Com efeito, em todo o mundo Católico, as mulheres, inspiradas pelo espírito das suas regiões, assavam com zelo os seus pães típicos da Páscoa, prestando assim homenagem aos sublimes mistérios do dia.
Verdes e renovação
O Pão da Vida se entregou a nós na primavera, quando a paisagem escura e morta do inverno é substituída por uma folhagem verde vibrante. Por isso, Quinta-feira Verde (Gründonnerstag) é o nome dado à Quinta-feira Santa nos países germânicos e eslavos.
A origem exata deste nome é desconhecida, mas muitos acreditam que o nome deriva da antiga palavra alemã "greinen" (weinen em alemão moderno), que significa chorar. Esta é talvez uma alusão à readmissão dos penitentes na Igreja neste dia.
No passado, os penitentes que eram readmitidos na Igreja usavam raminhos das primeiras verduras da primavera como expressão de sua alegria e esperança, uma prática que deu aos penitentes o nome popular de “os verdes” (Die Grünen). (6) Outra possível explicação para o nome é que em muitos lugares antes do século 13, vestimentas verdes eram usadas para a Missa da Quinta-feira Santa.
Povos Católicos dos países da Europa Central comeram uma refeição composta por todos os alimentos verdes neste dia, os verdes foram inspirados no nome germânico e servindo como uma lembrança das ervas amargas comidas na refeição da Páscoa judaica.
Sendo a primavera a estação das plantas em brotamento, as pessoas não tiveram dificuldade em encontrar vegetais para encher seus pratos. Espinafre, azeda e outras verduras eram usadas para fazer saladas e sopas simples. Mesmo na América, esse costume foi preservado entre os holandeses da Pensilvânia, que continuaram a tradição de seus ancestrais alemães comendo espinafre e folhas de dente-de-leão. (7)
Em muitas áreas, apenas uma refeição consistia de uma sopa de ervas verdes seguida de uma salada verde. A sopa verde, tradicional na França e na Europa Central, tinha que ser preparada com um número simbólico de ervas (nove ou sete).
As ervas utilizadas variavam de região para região, mas as mais comuns eram os rebentos de urtiga, sabugueiro, abutre, margaridas, dente-de-leão, plátano, azeda, alho selvagem e urtiga. (8) Tão apreciadas eram as tradicionais sete ervas da sopa francesa que os colonos trouxeram o costume para o Novo Mundo onde, em Nova Orleans, os vendedores gritavam aos transeuntes: "Compre suas sete verduras para dar sorte!" (9)
As propriedades curativas e purificadoras das verduras da primavera consumidas na Quinta-feira Santa tinham uma conexão simbólica com a liturgia. Desde os tempos antigos, as pessoas valorizavam os primeiros verdes do ano, porque se acreditava que eles continham todo o poder dos sucos que fluíam nas plantas. Os primeiros verdes da primavera são sinais de esperança, purificando aqueles que deles participam, assim como a liturgia da Quinta-feira Santa do passado purificou os pecadores que haviam feito penitência, estabelecendo assim uma nova vida de primavera em suas almas.
Este tema de penitência e purificação fez com que este dia fosse escolhido como um dia para se dedicar à purificação do materialismo.
Purificação para a Páscoa
A Quinta-feira Santa ficou conhecida como “Quinta-Feira Limpa” ou “Quinta-Feira Pura” na Rússia e nos países do Leste Europeu, porque penitentes e catecúmenos podiam tomar banho para se prepararem para a “Missa da Remissão,” na qual eram purificados de seus pecados e eram recebidos de volta pela Igreja.
Muitos fiéis imitaram esse costume, lavando bem os cabelos e o corpo, para que, purificados na carne, pudessem estar mais dispostos a receber as graças purificadoras do
Tríduo.
Os britânicos e escandinavos chamavam este dia de "Quinta-feira Pura," porque era costume que monges e leigos "cortassem" seus cabelos ou barba neste dia em preparação para a festa da Páscoa. A palavra "shere" ou "sheer" vem do inglês médio shere ou sheere, que significa "puro," "sem mistura," "limpo." Deste modo, "shere" alude não só ao ato de cortar, mas também à purificação do corpo e da alma que se realizava na Quinta-feira Santa. (11)
Antes do nascer do sol nos países da Europa Central e Oriental, as mães mandavam seus filhos ao rio mais próximo para se banharem na água fria como cura para a preguiça. Quando as crianças voltavam do banho, recebiam os pãezinhos doces com mel da Quinta-feira Santa. Muitos homens checos se lavavam em um riacho à meia-noite da Quinta-feira Santa em homenagem a Nosso Senhor, que caiu no ribeiro de Cédron enquanto era conduzido do Getsêmani para a casa de Caifás.
A limpeza não era um requisito apenas para o corpo: toda a casa tinha que estar imaculada até a noite de Quinta-feira Santa. As chaminés foram varridas, os cobertores arejados, as despensas e as cozinhas bem esfregadas, e os pisos e paredes limpos até brilharem. Os primeiros três dias da Semana Santa foram reservados para esta limpeza de primavera, mas a Quinta-Feira Santa muitas vezes encontrou as pessoas dando os retoques finais em seu trabalho.
Camponeses checos, eslovacos e russos usavam os galhos de salgueiro abençoados do Domingo de Ramos para bater na cama e varrer cada canto do chão. Nenhuma partícula de sujeira passou despercebida; as mulheres eslovacas varriam até os pátios e as ruas. Após a varredura, um fio de palha foi usado para borrifar água benta pela casa.
Na Rússia e em outros países do Leste Europeu, a casa prístina foi então embelezada: esteiras foram espalhadas no chão, lindas toalhas expostas e soleiras decoradas com ramos de salgueiro em preparação para a grande festa. (12)
Tal era o ardor com que nossos antepassados Católicos se preparavam para a santa festa da Páscoa e tal deveria ser também o nosso fervor. Os símbolos da liturgia e da natureza nos mostram harmonicamente como podemos santificar nossas tarefas domésticas nestes dias mais sagrados.
Continua
Postado em 13 de abril de 2022
Iluminura medieval da Última Ceia
Na Idade Média, havia três Missas ditas neste dia. A primeira Missa foi a "Missa da Remissão," durante a qual os penitentes públicos foram solenemente recebidos de volta à Igreja. A segunda Missa, que ainda hoje é dita, é a “Missa do Crisma.” Durante a mesma, o Bispo benze os santos óleos a serem usados em sua Diocese no próximo ano. A terceira Missa é a “Missa da Ceia do Senhor” em comemoração da instituição da Sagrada Eucaristia e do sacerdócio.
O simbolismo da liturgia dessas Missas inspirou os povos Católicos a desenvolver seus próprios costumes e devoções particulares.
Assando Pão em Honra do Pão da Vida
O dia em que o Pão da Vida alimentou Seus Apóstolos com Seu próprio Corpo e Sangue não poderia deixar de inspirar as donas de casa Católicas a escolher este dia para assar o pão em memória de seu amado Senhor. Em muitos países, pães especiais eram consumidos no café da manhã da Quinta-feira Santa. Segundo a tradição, os pãezinhos eram sempre servidos com mel.
Acima, o italiano Panini di Ramerino;
abaixo, rolinhos de doces
checos de Jidášky com mel
Cada região tinha suas receitas exclusivas para os rolinhos da Quinta-feira Santa. Em Florença, toda boa dona de casa assava Panini di Ramerino (pãezinhos de alecrim), marcando cada pão com uma cruz. Na Alemanha, os pãezinhos eram recheados com mel e chamados Judasohren (orelhas de Judas) ou Judasbrötchen, enquanto na Checoslováquia eram feitos os Jidášky pães doces em forma de cordas). (2)
Esses rolos com o nome de Judas eram um lembrete para crianças e adultos do trágico destino do infame traidor. (3)
As donas de casa também começaram a preparar seus pães de Páscoa neste dia para que pudessem receber uma bênção especial por terem sido assados no dia em que o verdadeiro fim do pão foi revelado.
As donas de casa búlgaras faziam um novo fermento na Quinta-feira Santa misturando milho, lúpulo, feijão ou grão de bico com a massa de pão. (4) As donas de casa gregas assavam seu pão doce de Páscoa (tsoureki) cheio de especiarias e moldado em formas simbólicas. (5) Com efeito, em todo o mundo Católico, as mulheres, inspiradas pelo espírito das suas regiões, assavam com zelo os seus pães típicos da Páscoa, prestando assim homenagem aos sublimes mistérios do dia.
Verdes e renovação
O Pão da Vida se entregou a nós na primavera, quando a paisagem escura e morta do inverno é substituída por uma folhagem verde vibrante. Por isso, Quinta-feira Verde (Gründonnerstag) é o nome dado à Quinta-feira Santa nos países germânicos e eslavos.
A origem exata deste nome é desconhecida, mas muitos acreditam que o nome deriva da antiga palavra alemã "greinen" (weinen em alemão moderno), que significa chorar. Esta é talvez uma alusão à readmissão dos penitentes na Igreja neste dia.
Sopa de nove ervas para a 'Quinta-feira Verde'; abaixo, as ervas tradicionais colhidas para a Quinta-feira Santa
Povos Católicos dos países da Europa Central comeram uma refeição composta por todos os alimentos verdes neste dia, os verdes foram inspirados no nome germânico e servindo como uma lembrança das ervas amargas comidas na refeição da Páscoa judaica.
Sendo a primavera a estação das plantas em brotamento, as pessoas não tiveram dificuldade em encontrar vegetais para encher seus pratos. Espinafre, azeda e outras verduras eram usadas para fazer saladas e sopas simples. Mesmo na América, esse costume foi preservado entre os holandeses da Pensilvânia, que continuaram a tradição de seus ancestrais alemães comendo espinafre e folhas de dente-de-leão. (7)
Em muitas áreas, apenas uma refeição consistia de uma sopa de ervas verdes seguida de uma salada verde. A sopa verde, tradicional na França e na Europa Central, tinha que ser preparada com um número simbólico de ervas (nove ou sete).
As ervas utilizadas variavam de região para região, mas as mais comuns eram os rebentos de urtiga, sabugueiro, abutre, margaridas, dente-de-leão, plátano, azeda, alho selvagem e urtiga. (8) Tão apreciadas eram as tradicionais sete ervas da sopa francesa que os colonos trouxeram o costume para o Novo Mundo onde, em Nova Orleans, os vendedores gritavam aos transeuntes: "Compre suas sete verduras para dar sorte!" (9)
As propriedades curativas e purificadoras das verduras da primavera consumidas na Quinta-feira Santa tinham uma conexão simbólica com a liturgia. Desde os tempos antigos, as pessoas valorizavam os primeiros verdes do ano, porque se acreditava que eles continham todo o poder dos sucos que fluíam nas plantas. Os primeiros verdes da primavera são sinais de esperança, purificando aqueles que deles participam, assim como a liturgia da Quinta-feira Santa do passado purificou os pecadores que haviam feito penitência, estabelecendo assim uma nova vida de primavera em suas almas.
Este tema de penitência e purificação fez com que este dia fosse escolhido como um dia para se dedicar à purificação do materialismo.
Purificação para a Páscoa
A Quinta-feira Santa ficou conhecida como “Quinta-Feira Limpa” ou “Quinta-Feira Pura” na Rússia e nos países do Leste Europeu, porque penitentes e catecúmenos podiam tomar banho para se prepararem para a “Missa da Remissão,” na qual eram purificados de seus pecados e eram recebidos de volta pela Igreja.
Penitentes ajoelham-se à porta da catedral para serem readmitidos na Quinta-feira Santa
Os britânicos e escandinavos chamavam este dia de "Quinta-feira Pura," porque era costume que monges e leigos "cortassem" seus cabelos ou barba neste dia em preparação para a festa da Páscoa. A palavra "shere" ou "sheer" vem do inglês médio shere ou sheere, que significa "puro," "sem mistura," "limpo." Deste modo, "shere" alude não só ao ato de cortar, mas também à purificação do corpo e da alma que se realizava na Quinta-feira Santa. (11)
Antes do nascer do sol nos países da Europa Central e Oriental, as mães mandavam seus filhos ao rio mais próximo para se banharem na água fria como cura para a preguiça. Quando as crianças voltavam do banho, recebiam os pãezinhos doces com mel da Quinta-feira Santa. Muitos homens checos se lavavam em um riacho à meia-noite da Quinta-feira Santa em homenagem a Nosso Senhor, que caiu no ribeiro de Cédron enquanto era conduzido do Getsêmani para a casa de Caifás.
Os pais enviavam os filhos para tomar banho nos riachos das montanhas para limpar seus corpos para o Tríduo
Camponeses checos, eslovacos e russos usavam os galhos de salgueiro abençoados do Domingo de Ramos para bater na cama e varrer cada canto do chão. Nenhuma partícula de sujeira passou despercebida; as mulheres eslovacas varriam até os pátios e as ruas. Após a varredura, um fio de palha foi usado para borrifar água benta pela casa.
Na Rússia e em outros países do Leste Europeu, a casa prístina foi então embelezada: esteiras foram espalhadas no chão, lindas toalhas expostas e soleiras decoradas com ramos de salgueiro em preparação para a grande festa. (12)
Tal era o ardor com que nossos antepassados Católicos se preparavam para a santa festa da Páscoa e tal deveria ser também o nosso fervor. Os símbolos da liturgia e da natureza nos mostram harmonicamente como podemos santificar nossas tarefas domésticas nestes dias mais sagrados.
Os restos da tumba de Absalão pairam sobre o Ribeiro de Cédron,
onde Nosso Senhor tropeçou e caiu
- Sophie Hodorowicz Knab, Polish Customs, Traditions, and Folklore (New York: Hippocrene Books, 1996), p. 99.
- Richard Thonger, A Calendar of German Customs (London: Oswald Wolff, 1966), p. 35.
- http://www.myczechrepublic.com/czech_culture/czech_holidays/easter/green_thursday.html
- Mercia MacDermott, Bulgarian Folk Customs (London and Philadelphia: Jessica Kingsley Publishers, 1998), p. 211.
- George A. Megas, Greek Calendar Customs (Athens: B. and M. Rhodis, 1963), p. 96.
- http://www.brauchtumsseiten.de/a-z/g/gruendonnerstag/home.html
- Katherine Burton and Helmut Ripperger, Feast Day Cookbook (Catholic Authors Press, 2005), p. 50.
- http://www.brauchtumskalender.at/brauch-109-gruendonnerstag
- Evelyn Birge Vitz, A Continual Feast (San Fransisco: Ignatius Press, 1985), p. 187.
- In "Festival" printed by Wynkyn de Worde in 1511: "Yf a man aske why Shere Thursday is called so, ye may saye that in Holy Churche it is called (Cena Domini) our Lordes Souper daye; for that day he souped with this Discyples openly; and after souper he gave them his flesshe and his blode to ete and drynke. It is also in Englysshe called Sher Thursdaye, for in olde faders dayes the people wold that daye sher there heedes, and clyppe theyr berdes, and poll theyr heedes, and so make them honest ayenst Ester Day."
- William S. Walsh, Curiosities of Popular Customs and of Rites, Ceremonies, Observances, and Miscellaneous Antiquities (Philadelphia: J. B. Lippincott Company, 1898), p. 672.
- Polina Rozhnova, A Russian Folk Calendar (Moscow: Novosti, 1992), pp. 68-69.
Postado em 13 de abril de 2022
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