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Decadência da Gravitas no Clero da Igreja - I

De São Domingos ao Cardeal Richelieu

Plinio Corrêa de Oliveira


São Domingos - Fra Angelico é, por um lado, um artista bem qualificado para retratar a gravidade dos homens e, por outro, um dos menos qualificados para tal. Isso porque de certa forma suas pinturas transcendem as fragilidades da natureza humana e retrata o homem quase sem pecado original.

St. Dominic by Fra Angelico

Aqui temos São Domingos pintado por Fra Angelico. São Domingos é visto aqui vestido com seu hábito dominicano em uma atitude pensativa, ainda muito jovem e delicada.

Um traço característico da gravidade aparece em sua concentração completa. Ele está totalmente focado no que está lendo. Uma das coisas mais difíceis para o homem contemporâneo é fixar sua atenção em um tema árido e entrar nele por completo, a capacidade de transcender o concreto.

Essa concentração se traduz em algo como uma carranca na testa de São Domingos. Aqui o vemos sentindo a dificuldade de entender o que está lendo. Sua mente está entrando em um labirinto e ele quer resolver algo que oferece uma resistência natural ao seu entendimento.

A sua gravidade é acentuada e completada pela grande serenidade do conjunto. Seu esforço intelectual é sério, calmo e desapegado, sem nenhuma pretensão de assumir papéis imaginários. Ele é quem é, sozinho diante dos olhos de Deus e desejando encontrar a verdade.

Esta foto poderia ser intitulada “Esforço de uma alma séria, correta e piedosa para encontrar a verdade.”

São Bernardino de Siena

St Bernardino of Siena

Aqui não encontramos mais o homem de estudos, mas o pregador. Ele é São Bernardino de Sena que difundiu a devoção do Santo Nome de Jesus. Era um pregador que atraía imensas multidões em grandes praças. Enquanto ele falava, a multidão mudava de posição, seguindo a direção do vento, para ouvir suas palavras. Olhe para o rosto dele. É o rosto de um homem que sabe que está investido da missão divina de contar as verdades mais duras aos seus contemporâneos, que é, de fato, o que ele fez.

Nesta foto ele aparece como se estivesse dizendo essas verdades e cumprindo sua missão. E se as pessoas não ouvissem, carvões em brasa cairiam sobre suas cabeças.

Sua mente está repleta de ideias, convicções sobre o caráter transcendental e a perfeição infinita de Deus e o alto destino eterno do homem. Em seu olhar ardente não há lugar para assuntos insignificantes. Ele exibe uma enorme grandeza e seriedade.

Abade Suger

 Abbe de Suger

Aqui você tem um retrato do abade Suger, que foi ministro do Rei Luís VII da França.

Nesta foto, ele é representado como um estadista e não como um homem religioso. Nele não vemos o intelectual ou o homem investido de uma missão divina, mas sim o homem de pensamento acostumado a governar. Nesse sentido, essa representação é expressiva.

Podemos observar o porte viril e a gravidade e seriedade de sua pessoa. Se o compararmos com nossos atuais Ministros de Estado, percebemos a imensa gravidade desse homem.

Cardeal Richelieu

Aqui se vê o quanto as coisas mudaram. Neste retrato do Cardeal Richelieu, é inútil procurar o fogo de um São Bernardino de Sena ou sua consciência de uma missão divina; é inútil procurar algo transcendental, qualquer coisa que vá além da natureza humana.

Cardinal Richelieu by Philippe de Champaigne

O que aconteceu? Antes, os homens haviam adquirido uma grande elevação sobrenatural que era acompanhada por uma grande elevação natural. Quando eles perderam aquela elevação sobrenatural, a elevação natural continuou a existir por algum tempo. Havia uma espécie de velocidade adquirida na virtude que perdurou por um certo tempo, embora diminuísse a cada geração. A propulsão dessa velocidade parou após a apostasia da Cristandade, embora o movimento continuasse por um tempo, e assim os homens de cada geração pioraram.

São Pio X expressou este mesmo princípio, dizendo que quando um vaso de flores é retirado de uma sala, ainda conserva por algum tempo a flagrância das flores. Nesta foto o sobrenatural não está mais lá, mas seu perfume ainda está presente.

Este retrato mostra Richelieu como um homem cujo espírito domina completamente a matéria, porque este homem é todo olhos, olhos que são toda alma.

Seus olhos são grandes e luminosos, indicando uma vontade forte e engenhosa, um homem que deseja ardentemente o que deseja e executa com determinação suas resoluções. Ele não tem nada daqueles homens moles que desejam uma coisa e após, depois de um tempo, caem no chão, exaustos de seus esforços. Aqui temos uma vontade determinada e iluminada pela inteligência. Seu corpo é esbelto, mas seu porte e tudo mais – inclusive a capa – expressam essa vontade.

Vemos a queda dos tipos anteriores de homem, mas, mesmo assim, admiraríamos tal homem se o cruzássemos em alguma igreja.

Continua

Postado em 7 de outubro de 2022

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