Respondendo ao seu pedido para comentar a Ponte Alexandre III, em Paris, diria que dá uma ideia da elegância do gênio francês de tempos passados. As tampas dessas belas luminárias me dão a impressão de frascos de perfume. Suas formas me lembram recipientes para perfumes preciosos que poderiam ser colocados, se fossem bem menores, na penteadeira de uma senhora. São tão bem-feitos, tão delicados que não parecem ter sido feitos para ficar expostos às intempéries. No conjunto encontramos a nota francesa de doçura, daquela suavidade própria do espírito francês.
Vemos a entrada da ponte, que só pode ser descrita como monumental. É composta por duas colunas, e no topo de cada uma estão cenas mitológicas folheadas a ouro. Este, à direita, exibe uma espécie de herói segurando uma espada em uma das mãos enquanto a outra segura um cavalo alado pronto para voar. Os gestos, embora bastante teatrais, são elegantes.
Tudo nesta ponte me dá a impressão de algo etéreo, de algo muito nobre. Uma nota aristocrática está visivelmente presente na construção desta ponte. Há também uma nota espiritual, no sentido da predominância do espírito sobre a matéria, porque o espírito impregna a matéria e a molda, de modo que quando um observador olha para isso, é convidado a pensar nas coisas que são espirituais. Estados de espírito dos homens, por exemplo.
Podemos dizer também que há aqui algo de sagrado na predominância do artístico sobre o funcional. Quando vemos aquelas lâmpadas, temos a impressão de que não foram feitas primordialmente para utilidade. À primeira vista pensamos mais na sua beleza do que na sua função prática de iluminação, e temos a impressão de que ali foram colocados principalmente para adornar a ponte. Podemos dizer que esta nota de adorno está mais presente aqui do que na Ponte Rialto que analisamos recentemente. É uma obra de arte da belle époque, época histórica que se desenrolou em França após a Revolução Francesa sob o regime republicano, mas no quadro de uma Europa monárquica e de uma sociedade francesa ainda profundamente aristocrática.
Nesta ponte há vestígios do Ancien Régime mas nela a sensação de gozo da vida é intensa. A Paris daquela época exalava o orgulho de ser a capital de todos os prazeres do mundo, e esta ponte foi construída para dar prazer aos olhos, para desviar o homem, para lhe dar a vontade de viver e de viver nesta terra. Tudo isto me parece presente nela – de tal forma que este seria, a meu ver, o ponto dessacralizador da ponte.
A Ponte Alexandre III já não fala da Idade Média. Se a Ponte Rialto ainda conserva uma vaga impressão da Idade Média, aqui estamos tão afastados dela que nem sequer podemos considerá-la. Se a Rialto tem um aroma da Idade Média, aqui há um aroma do Ancien Régime, e que é, como sabem, um perfume muito menos denso no espírito contrarrevolucionário do que o da Idade Média.
Agora eu convido você a comparar esta ponte com o Viaduto do Chá [o viaduto central no centro de São Paulo]. O Viaduto do Chá é uma placa de cimento, opaca e plana. Não tem balaustradas bonitas em nenhum dos lados, mas apenas algumas grades que parecem estar lá apenas para evitar que algum louco pule dele. O que ele traz à mente é seu propósito funcional acima de tudo. Aqui e ali encontramos algumas colunas - tão pesadas e monótonas quanto possível.
Vemos que nenhuma comparação é possível. Poderíamos dizer que o Viaduto é uma construção feita por bárbaros em comparação com a Ponte Alexandre III. Quando comparamos a Alexandre III com a Rialto, notamos que a primeira é mais rica, muito mais cara do que a última. Mas a arte e a graça da Rialto são superiores à ponte Alexandre III. Não há artista que ousaria dizer que a Rialto tem menos valor do que esta ponte. Pelo contrário, a Rialto tem mais valor artístico do que a Alexandre III.
Traduzido da transcrição de uma fita pela secretaria da TIA
Postado em 9 de setembro de 2024
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