Depois da Idade Média, ocorreu um fenômeno na nobreza caracterizada por uma perda geral da Fé. Até a Revolução Francesa, os nobres continuavam a crer, rezar e praticar a Fé, mas o modelo de guerreiro foi se laicizando. Influenciado pelo mito do herói pagão do Renascimento, o ideal do guerreiro mudou. Não era mais um Cruzado que morreria defendendo a Fé católica, mas um mosqueteiro que lutava para provar suas qualidades de excelência: ele era simultaneamente corajoso, elegante, instruído, poeta e muito cortês.
Perdendo seu modelo medieval, nobres foram laicizados |
Essa excelência - apesar de não ser tão perfeita como a nobreza dos Cruzados - ainda distinguia a nobreza, pois toda forma de excelência humana convém ao nobre.
As características dos burgueses são diferentes das dos nobres. Falo aqui da burguesia católica em uma sociedade saudável, tipicamente definida como um homem sério, honesto, seguro e estável.
Quando um empresário organiza bem suas finanças e descobre que tem um excedente de fundos, pode muito bem decidir dar passos mais ousados com esse dinheiro. Essa ousadia não implica necessariamente que ele arriscará sua vida, mas sim esse excedente. Ele pode indiretamente arriscar sua vida, por exemplo, indo ao Transvaal na África do Sul para negociar nas minas de diamantes de lá. Ele precisa enfrentar os perigos da viagem, um ambiente selvagem e hostil que pode levar à sua morte, mas ele está disposto a correr esses riscos. Essa coragem do empresário tem certa beleza.
O bem-sucedido homem do comércio também pode patrocinar obras de caridade, arte e educação ou outras obras benéficas para a sociedade com sua grande fortuna. Fazendo isso, ele manifesta uma generosidade que, embora menos que a glória militar, possui certos elementos que lhe conferem algumas características de um nobre.
Admito que um título menor de nobreza poderia ser dado a alguns artesãos muito refinados - como Fabergé, que criou essa excelente coleção de joias em forma de ovos, tão magnífica que o Tzar da Rússia daria uma à Tzarina a cada ano. O mesmo poderia ser dito para os artistas - porque esses artesãos realmente se tornaram artistas - que construíram as carruagens reais que ainda permanecem em uso nas monarquias nórdicas e anglo-saxônicas.
Ainda existe outra ocupação na esfera comercial que pode elevar um homem a um estado nobre. Como a economia de hoje não é mais uma simples questão de economizar o salário ou os lucros, como costumava ser, mas constitui uma nova, complexa e extensa ciência, ninguém pode negar que exige um esforço intelectual para obter sucesso comparável ao de um estudioso da universidade. É um campo claramente inferior porque o homem comercial está focado no lucro pessoal enquanto o professor se volta para uma causa mais elevada, mas é análoga. Os grandes homens do comércio ou da indústria precisam aprender essa ciência por meio de um esforço real que tenha mérito.
Essas posições no mundo comercial e econômico geram um tipo secundário de excelência que, na prática, pode ter uma enorme importância. Os esforços desses homens não podem ser simples e puramente comparados ao trabalho manual típico das pessoas (1).
A excelência da arte de Fabergé o tornou digno de um título
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Um burguês que se torne um grande diplomata e desempenhe um papel importante na elaboração de tratados internacionais normalmente também deve ser incorporado à nobreza. Da mesma forma, um médico que descobre a cura para uma doença perigosa como a hanseníase.
Como se pode ver, a camada superior da classe burguesa pode transcender seu próprio nível - e normalmente o faz - para gerar uma mesquinha nobreza mediana. É menor que a noblesse de robe – a nobreza togada, própria dos magistrados - e de forma alguma é comparável à noblesse d’epée – a nobreza da espada, própria dos nobres feudais. Estes últimos têm a glória daqueles que estão prontos para morrer por seu país e pela Cristandade. Ao estudar os vários tipos de nobrezas, devemos sempre manter essas distinções.
É necessário entender que certas profissões podem ter maior importância em alguns lugares do que em outros. Por exemplo, Veneza não era forte em terra, mas possuía grandes frotas. Para sobreviver, contava com diplomatas extremamente hábeis - e eram realmente excelentes. Portanto, a carreira diplomática elevou mais pessoas à nobreza em Veneza do que em outros lugares.
Na França, costumava haver a noblesse de cloche ou noblesse de village – a nobreza do sino ou da aldeia. Era composta por pessoas que se destacavam em pequenas funções urbanas, como o prefeito ou o tabelião, que conquistaram a admiração geral e a veneração do povo da aldeia por causa de sua confiabilidade, moralidade e dignidade.
Aqui os senhores. tem uma descrição dos numerosos tipos de nobreza em uma sociedade orgânica. A nobreza, como se vê, não é algo fixo e morto, mas uma classe variada e viva que abrange diferentes tipos de pessoas. É nosso dever, como contra-revolucionários, conhecer essas distinções para defender a orgânica nobreza católica. A Revolução sempre esconde essas transições harmônicas na nobreza e tenta apresentá-la apenas como uma aristocracia muito refinada, em contraste com um povo supostamente rude e explorado. Ao apresentar apenas os dois extremos da escada social, é fácil incutir um falso antagonismo entre os dois. Esse sofisma favorece a destruição da hierarquia social católica.
De fato, a força da nobreza reside em suas transições internas. Uma vez negadas essas transições, fica mais fácil apresentar uma caricatura da nobreza e forçar sua destruição.
1. Segundo a definição clássica de sociedade Católica, é dividida em três classes: o clero, a nobreza e o povo. O povo, a terceira classe, por sua vez, é dividido em burguesia e plebeus. O Professor Plinio aqui se refere a essa divisão quando afirma que a burguesia pode frequentemente transcender sua própria classe para entrar na pequena nobreza.
Postado em 9 de março de 2020
| Prof. Plinio |
Sociedade Orgânica foi um tema caro ao falecido Prof. Plinio Corrêa de Oliveira. Ele abordou este tema em inúmeras ocasiões durante a sua vida - às vezes em palestras para a formação de seus discípulos, às vezes em reuniões com amigos que se reuniram para estudar os aspectos sociais e história da cristandade, às vezes apenas de passagem.
Atila S. Guimarães selecionou trechos dessas palestras e conversas a partir das transcrições das fitas e de suas anotações pessoais. Ele traduziu e adaptou-os em artigos para o site da TIA. Nestes textos, a fidelidade às idéias e palavras originais é mantida o máximo possível.
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