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A Respeitabilidade nas Profissões Medievais

Plinio Corrêa de Oliveira

Na obra bona fide medieval vemos bispos que não foram canonizados, e talvez não tenham sido santos, mas que fizeram coisas extraordinárias em suas vidas. Com certeza, fosse relevante marca de suas biografias o fato de terem sido santos. Tomemos o caso do Bispo Ademar de Monteil, legado papal na primeira Cruzada. Não sei muitas coisas sobre sua vida, mas vamos supor que ele tenha sido santo. No entanto, sua presença durante a primeira Cruzada foi o elemento central que unificou aqueles barões enérgicos e difíceis de ser controlados.

Adhemar de Monteuil finds the Holy Lance

Bispo Ademar de Monteil com a Lança Sagrada, descoberta enterrada em Antioquia, na Primeira Cruzada
Quando comparamos a história das Cruzadas posteriores à primeira, notamos ter faltado às outras um homem que unificasse os diferentes interesses temporais dos reis e príncipes que participavam da luta.

Esta pedra angular da primeira Cruzada foi o Bispo Ademar de Monteil. Diplomata muito habilidoso, a harmonia entre os diversos líderes da Cruzada se manteve até Jerusalém ser libertada, tendo sido eleito Godofredo de Bouillon seu primeiro Rei.

Em certo sentido, todo o ideal da Cruzada dependia dele. Assim, mesmo supondo que não tivesse as virtudes heroicas necessárias para ser declarado santo, realizou essa ação unificadora que o elevou muito acima da ação comum dos homens.

Esse não é um caso isolado. Trata-se de um exemplo entre inúmeras ações de bons Bispos que nunca foram elevados aos altares. A existência desses bispos santos, somada a essas ações extraordinárias de outros tantos, tornou a posição episcopal altamente respeitável.

Assim, o bispo medieval com seu hábito, mitra, bordão e adornos representa o ideal de um bispo, um ideal imortalizado na pedra das estátuas exteriores das catedrais. A vida religiosa vivida com seriedade gerou uma grande respeitabilidade para o ofício episcopal.

O homem medieval via o bispo como representante de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ele retratava Nosso Senhor como um bispo, e o bispo como Nosso Senhor. O bispo era para ele o homem que tinha o poder de consagrar o anfitrião, perdoar os pecados, o homem que possuía as chaves de todos os poderes da diocese e era o centro da sua vida. Ele foi o sucessor dos Apóstolos, e de certa forma representou para o povo outro São Pedro ou São Paulo ou quaisquer dos Apóstolos.

Sarmental Portal, Burgos

A figura de um Bispo no Portal Sarmental
na Catedral de Burgos
A vida do bispo era isolada, envolta em mistério, sem os prazeres mundanos. Num edifício denominado Palácio Episcopal vivia com dignidade e até com conforto, mas era uma vida isolada, de certo modo como a de um monge solitário no deserto.

Esses elementos também contribuíram para a alta respeitabilidade do bispo medieval, que se estendia ao sacerdote.

Essa respeitabilidade continuou em boa medida até que João XXIII decidiu “limpar a poeira que se acumulou na Igreja desde o tempo de Constantino.” Ele e seu concílio quebraram esse ideal, e geraram um tipo diferente de bispo e de padre que não inspira o respeito público.

Numa das suas obras, o conhecido autor francês Paul Claudel descreve um padre de uma pequena aldeia que passa os dias a percorrer as ruas da aldeia, visitando e fazendo apostolado com o povo, apertando mãos e conversando. Mas ninguém pensa em convidá-lo para ficar mais tempo. Então, Claudel imagina o padre voltando no início da noite para sua casa paroquial e ficando sozinho o resto da noite, sem ninguém para lhe fazer companhia. Esta misteriosa solidão faria com que os fiéis o olhassem à luz de uma grande respeitabilidade e ternura.

Esta atmosfera de prestígio em torno do padre perdurou em muitos lugares até pouco antes do Concílio. Conheci um padre em São Paulo que era assim. Ele percorria as ruas de sua paróquia e, por onde passava, as crianças vinham correndo e pediam sua bênção. Ele a dava livremente com um rosto sorridente e cheio de bondade. Em seguida, as crianças se dispersavam para jogar futebol na rua e ele continuava sua caminhada numa espécie de nuvem de solidão que voltava a envolvê-lo a cada novo contato. Ele era muito respeitável, dando-nos uma ideia em menor escala da respeitabilidade que cercava o bispo.

O Imperador e o Rei

Para o homem medieval, o imperador e o rei também representavam Nosso Senhor Jesus Cristo. Considere, por exemplo, São Fernando de Castela. O famoso Alcázar de Segóvia era um castelo-fortaleza fundamental para controlar seu reino.

Alcazar of Segovia

O famoso Alcázar de Segóvia, Espanha
Então, vamos imaginar a vida dele nas salas daquele castelo. Seu trono ficava no grande salão cerimonial, e perto dele estava outra grande sala, seus aposentos, onde ele ficava a maior parte do tempo. Era uma sala muito séria, solene e linda, onde ele e a rainha cuidavam de suas respectivas responsabilidades.

Sua única grande distração durante o dia era caminhar por dois grandes arcos até uma varanda que dava para o pátio interno do castelo e os campos circundantes. Podemos imaginar que além desses campos houvesse uma pequena fortaleza de cavaleiros Templários.

Portanto, a grande diversão deles era sentar-se em duas cadeiras de espaldar alto naquela varanda e observar os cavaleiros entrando e saindo de sua fortaleza. Esta era sua única distração. Eles tinham alguns poucos nobres na corte que normalmente estavam ao redor deles, mas eles costumavam manter certa distância dos soberanos. Assim, o rei e a rainha também viviam em clima de recolhimento e seriedade.

Quando eles deixavam seus aposentos, isso era um evento para as pessoas do castelo e das aldeias vizinhas. As pessoas vinham ver os soberanos, ajoelhar-se quando eles passavam, pedir a bênção do rei etc. Para eles, o rei era uma imagem de Nosso Senhor refletida na esfera temporal. O rei e a rainha gozavam de uma grande respeitabilidade, para a qual contribuíam a sacralidade e a solidão das suas vidas rodeadas por um mistério dourado.

O chefe da corporação

O chefe de uma corporação era como um pequeno nobre entre seus membros. Era muito respeitado e tratado com o respeito devido a um líder ou a um venerável avô. Portanto, altamente considerado por sua experiência, sabedoria, habilidades e idade.

Hoje, por causa da semente da Revolução que carregamos no espírito, perdemos até a noção do que aquela respeitabilidade representava como fator de estabilidade e de boas relações para a sociedade.

Uma coisa que podemos fazer para começar a apreciar essa respeitabilidade é lutar contra a tendência moderna de zombar e rir de tudo. Devemos retornar aos padrões de inocência que tínhamos quando éramos crianças, e dos quais muitos de nós desistimos para nos encaixar neste mundo revolucionário.

Postado em 19 de abril de 2021

Tradition in Action

Dr. Plinio Correa de Oliveira
Prof. Plinio
Sociedade Orgânica foi um tema caro ao falecido Prof. Plinio Corrêa de Oliveira. Ele abordou este tema em inúmeras ocasiões durante a sua vida - às vezes em palestras para a formação de seus discípulos, às vezes em reuniões com amigos que se reuniram para estudar os aspectos sociais e história da cristandade, às vezes apenas de passagem.

Atila S. Guimarães selecionou trechos dessas palestras e conversas a partir das transcrições das fitas e de suas anotações pessoais. Ele traduziu e adaptou-os em artigos para o site da TIA. Nestes textos, a fidelidade às ideias e palavras originais é mantida o máximo possível.

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