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Caminhos Verdadeiros e Falsos para a Felicidade - XXVI

O papel essencial dos arquétipos

Prof. Plinio Corrêa de Oliveira
Há tanta insistência hoje na necessidade de ser lógico, racional e coerente. Mas o que é necessário para alguém ser lógico?

Pitcher of water

Uma simples jarra pode desencadear a busca por valores mais altos

Imaginemos diante de nós uma jarra de água, muito simples, um tanto volumosa, cuja forma, porém, é agradável. Para ser lógico, devemos saber olhar para essa jarra e ver os valores que ela possui. Então devemos tentar discernir esses mesmos valores primeiro nas naturezas mineral, vegetal e animal, e depois nos homens.

Finalmente, devemos imaginá-los nos Anjos. E, acima dos Anjos, devemos procurar encontrar essas qualidades em Deus, porque todos os verdadeiros valores participam de uma perfeição de Deus.

Este é o caminho da lógica, mas uma lógica de amplos horizontes, sem visões restritivas.

A hierarquia do refinamento

Imagine que eu vá para a Inglaterra e encontre lá várias damas ilustres e de boa formação. Pergunto a um cavalheiro quem são elas.

Ele responde que são senhoras da velha burguesia tradicional da Inglaterra.

"Onde elas receberam a influência para se tornarem tão refinadas?"

Ele responde: "É muito simples. Elas olham para uma classe social mais alta, a nobreza. A nobreza é ainda mais refinada do que essas senhoras da burguesia, que têm parte de seu refinamento."

English club

Um clube inglês com convidados ilustres dá um tom aristocrático à sociedade; abaixo, um passeio na Espanha

paseo
"Mas onde eu encontraria essas damas da nobreza?"

"Em tal-e-tal clube."

"Entendo. Excelente! Mas as damas da nobreza, de quem receberam esse refinamento?"

"Temos uma Rainha que é o protótipo do refinamento, que representa a sua própria altura. Ela brota dela – pela alta posição que ocupa, pela magnífica educação que tem, pela hereditariedade especial que possui, pelo carisma que teria em uma monarquia, assim ela exala um refinamento especial que é o refinamento real.

"Ora, há burguesia refinada porque há nobres; e há nobres porque há reis. Existe uma pessoa que tem, em seu grau mais alto, uma certa qualidade da qual as outras participam. Se tal pessoa não existisse, esse tom aristocrático não existiria em toda a sociedade." (1)

Esta explicação não faz sentido? Não é razoável e natural?

É a busca pelo vermelho perfeito, já mencionada em artigo anterior, transposta para outro plano. Pode-se dizer que a Rainha é o absoluto de uma qualidade que se encontra em graus menores e diferentes em todo o corpo da sociedade inglesa.

Encontramos o mesmo processo em um país com uma vida cultural bem constituída. Vendo homens altamente cultos, alguém dirá: "Este país deve ter excelentes universidades e grandes estudiosos porque não pode haver tantos homens bem formados sem que haja um foco de aprendizado, por exemplo, uma universidade. E, para poder formar tantos homens altamente cultos, esta instituição deve ter pelo menos alguns sábios."

Ou seja, deve haver sempre alguns poucos que são o ponto focal irradiando qualidades nas quais os outros participam.

É assim que o universo é organizado. Todas as qualidades que existem nos seres vêm de seres superiores.

grousehunting on the moor

A roupa de caçadores de perdiz na charneca reflete um alto grau de refinamento na sociedade

Por isso afirma São Tomás: se no mundo existe alguma qualidade que eu veja, deve haver, além do mundo, um Ser que tenha essa qualidade em grau infinito. (3) No topo da pirâmide arquetípica está Deus.

Fechar com o exemplo da Rainha não iria ao fim da questão. Pois quem deu essa qualidade à Rainha? Parar na Rainha seria chegar ao topo de uma pirâmide truncada.

Deve haver outro Ser de quem ela o recebeu, um Ser que não o recebeu de ninguém, que o possui absoluta e infinitamente, um que não recebeu nada e que dá tudo aos outros seres. Um Ser no qual todas as coisas excelentes existem de maneira perfeita e infinita. Este ser é Deus.

O fato de existirem coisas belas, nobres, elevadas, harmônicas e ordenadas no mundo mostra que existe algo muito mais elevado. Demonstra a existência de Deus.

Essa busca de arquétipos nos faz buscar um ambiente material mais perfeito do que aquele que nos rodeia, que não faz mais do que participar de algum mais elevado. Mesmo se fôssemos ao Paraíso Terrestre – imaginemos essa hipótese irrealizável! – a alma bem formada não ficaria satisfeita. Pois as maravilhas ali convidariam a uma beleza ainda maior. Essa beleza seria justamente a do Paraíso Celestial, que, como sabemos, também é um lugar. (4)

O Paraíso Celestial para o Paraíso Terrestre tem uma superioridade maior do que o Paraíso Terrestre é para nossa Terra.

Nossa Senhora, um arquétipo para a raça humana

Esta doutrina da participação, que tem tantas aplicações no mundo temporal, pode ser útil também para a vida espiritual. Não é absurdo estabelecer uma relação entre esta doutrina e a da Sagrada Escravidão a Nossa Senhora, como se encontra no célebre Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem de São Luís Maria Grignion de Montfort.

Our Lady of the Blessed sacrament

Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento

Assim, quando recebemos Nosso Senhor na Sagrada Comunhão, podemos imaginar como Nossa Senhora O adoraria. Pois, se lhe pedirmos que adore Nosso Senhor por nós, Ela atenderá ao nosso pedido, e no Céu o adorará presente em nós. Posso imaginar no momento da Comunhão Nossa Senhora do Céu adorando-O em minha alma. Mas isso não é apenas uma invenção da imaginação, pode ser um ato real, se eu for escravo dela e pedir.

Uma maneira de fazer isso é considerar Nossa Senhora como a síntese da santidade de todas as pessoas boas que estiveram, estão e estarão neste mundo. Se tomarmos todas as pessoas boas que estiveram e estarão na terra até o fim do mundo, Ela possui a forma de santidade que cada uma dessas pessoas teve ou tem. Ela o possui de uma forma inimaginável, de uma forma excelente.

Cada homem é diferente dos outros em alguma coisa. Uma alma que conquistou a si mesma é alguém que dá glória a Deus de uma forma que ninguém mais dará, nem antes, durante ou depois de sua vida. Cada homem é capaz de adorar a Deus de uma maneira que só ele pode, para realizar os outros atos primários de adoração – ação de graças, reparação e petição – como só ele pode.

Nossa Senhora tem todos esses caminhos, mas à sua maneira. Por isso, posso fazer-lhe o seguinte pedido:

"Minha Mãe, entre as tuas incontáveis excelências, há em vós uma que é a mais alta perfeição do meu próprio modo de adorar. Uno o meu ato de adoração a esta perfeição ideal que está em vós. É assim que devo adorar o vosso Divino Filho. Adore-o desta forma por mim."

Seria como se eu estivesse falando com Ele com um microfone celestial que tornaria minha voz encantadora aos Seus ouvidos. Mesmo que eu gaguejasse e ficasse rouco, minha voz se tornaria maravilhosa porque seria como a voz de Nossa Senhora.

E assim concluo minha súplica: "Ó minha Mãe, dizei a Ele por mim. Vou pensar Nele, vou adorá-Lo e peço-te que façais o mesmo da tua maneira insondavelmente perfeita."

E então faço minha adoração a Nosso Senhor realmente presente na Sagrada Hóstia.

peasant house

As casas e as roupas dos camponeses assumem tons mais altos quando uma sociedade busca a excelência


Continua

  1. Há aqui uma alusão à teoria da participação. São Tomás diz: "Pois tudo o que se encontra em alguma coisa por participação deve ser causado por aquilo a que pertence essencial, como o ferro se torna ígneo pelo fogo... sendo por si mesmos, mas são seres por participação. Portanto, todos os seres que se diversificam pela participação diversa do ser, para serem mais ou menos perfeitos, devem necessariamente ser causados por um Primeiro Ser, que possui o ser mais perfeitamente." (Summa Theologiae, I, q. 44, a. 1, c.).
  2. Veja o que diz São Tomás no 1º Livro das Sentenças: "O primeiro em qualquer gênero, que é muito simples e muito perfeito, é a medida de todas as coisas que estão nesse gênero" (D. 8 , q. 4., A. 2, ad 3).
  3. Imperfecta a perfectis sumunt originem (O imperfeito tem sua origem no perfeito). Summa contra Gentiles, II, 15.
  4. Sobre isso, ver São Tomás, Summa Theologiae, I, q.70, a.2, ad 4; q.76, a.5, ad 2; q.91, a.1, ad 2, 3.
Postado em 16 de janeiro de 2023