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Liberalismo, Socialismo, Feudalismo - VI

A Família Medieval e a Subsidiariedade

Plinio Corrêa de Oliveira

Na sociedade medieval estruturada em torno do princípio da sudidiariedade, a célula principal, o fundamento da sociedade era a família. A família era considerada o modelo de ordem social. Na França os juristas tiveram uma bela expressão para mostrar o papel da família no Estado. Eles costumavam dizer que na sociedade medieval, o pai é o rei dos filhos e o rei é o pai dos pais. O regime era paternal.

A father's chair in a home

Por mais modesta que fosse, o pai tinha sua cadeira; em torno dele a família se reunia à noite
Nesse sistema paterno, por mais modesta que fosse a casa, o pai tinha sua cadeira especial na qual se sentava depois de voltar do trabalho, tirava os sapatos ásperos e se lavava. Na frente de sua cadeira havia um banquinho de madeira onde ele descansava os pés. Em uma mesinha lateral, estava o cachimbo pronto para fumar e um drinque colocado ali por sua esposa.

Enquanto ele descansava das fadigas do dia, as crianças vinham sentar-se ao seu redor e perguntar sobre seu dia. Essa conversa familiar continuaria durante o jantar, quando uma sopa nutritiva e um pão saudável seriam servidos. Depois, a família rezava e ia para a cama. Era o ambiente próprio da vida em família, que o pai governava completamente.

Reminiscente desse clima medieval era a vida das famílias luso-brasileiras na época da colônia, quando tudo gravitava em torno do pai. Algumas representações de famílias da época feitas por Debré são bastante pitorescas. Ele pintou famílias saindo juntas para parques públicos e praças aos domingos, andando em uma fila atrás do pai. Um forte tipo português, o pai liderava a fila com seu chapéu de duas pontas; depois dele vinham sua esposa, e depois os filhos por ordem de idade, seguidos pelos servos, que também se juntavam à família nas excursões e passeios de feriado de domingo. Isso representa a autoridade do pater, o pai.

O papel da primogenitura

No sistema de primogenitura, o pai geralmente deixava seu patrimônio para o filho mais velho. Mas isso não foi concebido de forma que o mais velho tivesse tudo e os outros nada.

Imaginemos o caso de um camponês que deixa sua casa e os pertences de seu filho ou de um nobre que deixa seu castelo para seu primogênito. Começaremos com o caso do nobre por ser mais simples.

A depiction of a Family tree

Pelos primogênitos, o patrimônio da família era guardado e melhorado; acima, uma árvore genealógica de nobres
O nobre normalmente tinha uma família grande, geralmente com 10 ou 15 filhos. Quando ele morresse, ele deixaria seu castelo e as terras do feudo que o cercava para seu filho mais velho. Não devemos imaginar que as outras crianças eram obrigadas a deixar a casa e começar uma nova vida do zero, com apenas o mais velho desfrutando de uma situação estável. Não eram assim que as coisas aconteciam.

O filho mais velho tinha a obrigação de cuidar dos irmãos e de providenciar – mediante a rede de relações familiares – uma boa situação para cada um. Então, ele iria assumir o papel de seu pai para seus irmãos e irmãs. Às vezes ele não conseguia encontrar situações adequadas para alguns deles, e a estes ele convidava para morar no castelo com suas próprias famílias. Normalmente, esses castelos eram enormes, com vários quartos extras. O filho mais velho tinha a obrigação de sustentar dessa forma seus irmãos.

Muitas vezes, esse dever se estende não apenas a seus irmãos e irmãs, mas também a seus primos menos afortunados ou outros parentes distantes de seu pai, avô ou mesmo bisavô. Então, ele usava os seus meios e influência para ajudar todas essas pessoas.

Não eram apenas os jovens em início de vida que o herdeiro devia ajudar. Havia também os idosos de sua família que não podiam mais trabalhar. O filho mais velho deveria recebê-los em suas terras e prover-lhes uma vida digna no castelo ou em alguma propriedade de seu feudo.

O papel da aventura

A statue in Paris of D'Artagnan

Em Paris, o lendário D'Artagnan foi imortalizado em bronze para relembrar seus feitos ousados e bravura
Agora, como a vida no campo pode ser bastante monótona, era comum os irmãos mais novos saírem de casa e partir em busca de aventuras. Na literatura francesa, vemos os cadetes, ou seja, os filhos mais novos de famílias nobres que iam para Paris e se alistavam no exército. Lá eles tentavam conquistar para si mesmos, por meio de sua bravura e heroísmo, uma situação melhor do que aquela que tinham em suas famílias.

Os personagens de Cyrano de Bergerac e do mosqueteiro D'Artagnan, retratados pelos autores Edmond Rostand e Alexander Dumas, são expressivos das aventuras que esses jovens nobres iriam empreender. Isso nos dá uma ideia do papel da aventura ao longo da Idade Média.

Assim, em vez de residir passivamente no campo contando com o irmão mais velho – situação que pode ser compreensivelmente entediante – esses jovens partiriam em busca de aventura. Mas mesmo aqui, encontramos o princípio orientador da subsidiariedade. Se eles falhassem em suas missões ou fossem gravemente feridos, eles sempre poderiam voltar a viver no castelo com o irmão mais velho.

A vida do trabalhador

Algo semelhante acontecia na vida do trabalhador manual. De um modo geral, a Idade Média não teve trabalhadores manuais como os nossos de hoje, que não possuem terras próprias. Então, o trabalhador tinha direito hereditário a uma parte das terras que alugava e trabalhava, que fornecia bens suficientes para seu sustento e de sua família. Quando ele morresse, seus descendentes teriam o mesmo direito àquela mesma terra. Esta situação repetia a do dono do castelo em alguns aspectos.

A castle overlooking a village

Tanto os aldeões quanto os nobres eram governados pelas regras de subsidiariedade
O trabalhador manual estava isento de ir à guerra. Ele poderia se alistar caso quisesse, mas não era obrigado a fazê-lo. Muitas vezes ele se alistava com o objetivo de ganhar recompensas por seus bravos feitos. Se ele se distinguisse heroicamente em uma batalha, o senhor lhe concederia suas próprias terras.

Era assim que o princípio da subsidiariedade funcionava em toda a sociedade. Os pais e seus primogênitos ajudavam os outros membros da família.

Isso explica por que o princípio moderno que exige partes iguais da herança para todos os filhos destrói o princípio da subsidiariedade na sociedade. Com distribuição igualitária do patrimônio do pai, cada filho faz o seu caminho, fazendo o que quiser com a sua parte. Em pouco tempo, o patrimônio da família se dispersa e ninguém se sente obrigado a ajudar o outro. Se alguém precisar de algo, ele pede ajuda a estranhos ou ao Estado. No sistema medieval guiado pelo princípio da subsidiariedade, porém, um ajudava o outro como membros da mesma família.

Como a história nos mostra, o exercício do princípio da subsidiariedade na Idade Média funcionou bem e trouxe prosperidade às famílias. O próprio Karl Marx escreveu em um de seus livros que a Idade Média foi a idade de ouro do trabalhador.

Essa foi a sábia organização que o espírito católico deu à estrutura social. Essa estrutura baseava-se no princípio da subsidiariedade.

Continua

Postado em 10 de janeiro de 2022

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